Mestra Alice Oliveira
Guapiara (SP)Neta de uma mulher indígena (com avô branco) e bisavós indígenas, Alice é nascida em Guapiara, interior de São Paulo. Faz das suas raízes, do gosto pela natureza, e do talento em manusear as fibras naturais, seu ofício. Alice aprendeu com o pai tudo o que sabe sobre como plantar as diferentes variedades de milho e perpetuar as sementes. O mesmo em relação aos trançados. O pai usava os balaios em casa e ela, menina de 5 ou 6 anos, ficava apenas olhando-o fazer.
Também aprendeu muito com as vizinhas. “Antes umas senhorinhas faziam. Elas ficavam ali sentadas fazendo umas bolsas de palha e eu ficava olhando e fui aprendendo. Fui fazendo por brincadeira, para brincar em casa. Dessa forma eu aprendi. Olhando e reproduzindo. Ninguém sentou e me ensinou. Nunca pedi ao meu pai. As pessoas mais velhas não gostavam de ensinar. Diziam que não era coisa de criança.”
Em 1989, sua primeira filha foi para a escola, e Alice queria dedicar mais tempo à maternidade. Pensou em encontrar um trabalho mais próximo à escola. Antes disso ela trabalhava “fazendo carga” na Central de Abastecimento CEASA, como pedreira, servente, ajudando o marido.
Resgatando o legado do pai e da família, passou a trançar novamente a palha. Mas também ensinava outras mulheres. “Fazíamos cadeira, trançados, tudo o que você imaginasse.”
O grupo foi crescendo, começaram a participar de feiras, vender, ficarem conhecidas. Em 2005 Alice passou a se dedicar ainda mais a ensinar e em 2009 fundaram uma cooperativa. Além de uma das fundadoras, se tornou a primeira presidente. Conseguiram levar para Guapiara um projeto de intercâmbio do HSBC Mundial, onde executivos do mundo todo eram recebidos por elas e, juntos, trabalhavam pelo aprimoramento do modelo do negócio. Se tornaram referência e modelo de sucesso para outra cidades vizinhas. Em 2012 ela ajudou a fundar uma associação, a qual também presidiu e permanece associada.
Conquistaram, em 2017, o Selo de Certificação de Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil, uma forma de demonstrar que uma ação promoveu resultados relevantes uma comunidade e pode ser reaplicada em outros territórios. Alice participa todo ano do Seminário e Feira de Troca de sementes e mudas tradicionais do Vale do Ribeira, um importante intercâmbio onde ensina e também aprende a cultura e forma de outras pessoas plantarem.
Um ponto muito importante de seu trabalho é o uso exclusivamente de palhas de milho crioulo, que são as variedades originais, que não passaram por modificação genética, e por isso guardam a memória da natureza em suas sementes, cada vez mais raras. São as ações de preservação e as feiras de troca que garantem a sobrevivência dessas espécies originais de milho, que são as únicas espécies de sementes férteis, que podem ser plantadas.
As cores dos milhos crioulos são deslumbrantes, roxos, marrons, algumas quase pretas.
Legitimamente foi reconhecida com o título de mestra pelo Programa do Artesanato Brasileiro, e cada vez mais foi disseminando seu conhecimento, viajando, dando oficinas através de convites do Sesc, escolas, organizações, pela Associação e prefeitura, conquistando ainda mais reconhecimento.
Infelizmente em daod momento perderam o apoio da prefeitura e a convivência foi ficando cada vez mais difícil. Finalmente em 2017 Alice mudou-se para Campinas com a filha, aprovada na universidade, e assim foi deixando novamente seu talento guiar os caminhos.
O Imaterial foi, com muito orgulho, a primeira loja a comercializar suas peças, em meio a um momento difícil na pandemia, e hoje Alice é uma parceira muito querida, uma amiga que faz parte da nossa história.